Não sei se vocês acreditam em amor a primeira vista! Mas existe, pois me apaixonei por uma vaquinha malhada desde o primeiro momento em que a vi numa foto, então resolvi buscá-la para mim. No pântano onde vivo o espaço é grande, têm muitas árvores, cachoeira e um gramado lindo numa beleza natural decorada com muitos animais livres e para melhorar o prazer do efeito visual deste paraíso, buscarei a vaquinha malhada pra morar aqui comigo e viver feliz. A vida é um livro com começo meio e fim. Oh! Minha vida. Você passa rápido como um pássaro voando. As linhas da felicidade em que piso está nas páginas do seu livro. Por favor! Não vire a página, pois se fizer isso me jogará para o passado e não saberei voltar para o presente. Falando em presente, está na hora de ir, pois convidei uma amiga para me acompanhar nesta viagem. Dei um beijo na foto da vaquinha e falei: Agora você será minha!
Nosso destino era o interior de Atibaia, por isso partimos bem cedo e enquanto ela dirigia, eu observava o desenho das planícies em verdes variados, fato raro era ver uma casa solitária infiltrada naquela imensidão verde.
Os olhos dela atentos na estrada tomavam toda a sua atenção, suas mãos firmes seguravam o volante enquanto seu pé acelerava sem dó e eu era hipnotizado pelas árvores que passavam estáticas, as faixas da estrada pareciam intermináveis sendo consumidas pela aceleração do veículo. O sono me levou embora e eu acabei mergulhado num sonho distante. De repente fui acordado por uma freada brusca.
- Por que você parou?
- Tem alguma coisa no meio da pista.
- Parece uma caixa abandonada. Vai ver o que tem nela!
- Vai você! Eu não vou.
- Onde estamos? A estrada está deserta.
- Não sei onde estamos, faz tempo que você está dormindo, até babou sonhando.
- Eu vou lá e você fica no carro. Se for um golpe vai embora e não pára.
- Vai devagar que eu ficarei com o carro preparado, se perceber algum perigo volta correndo para o carro.
- Fica esperta!
Saí devagar do carro e caminhei cautelosamente até a caixa. Não havia ninguém por perto e a caixa estava realmente abandonada no meio da estrada.
Pensei em tirá-la para o acostamento e continuar viagem, porém a curiosidade foi maior e fiquei observando seus detalhes. Tirei-a do meio da estrada e tentei adivinhar o seu conteúdo, mas estava difícil. Para abrir eu precisava de ferramentas, pois tinha um cadeado na tampa.
Fiz um sinal para ela esperar mais um pouco, pois ainda estava desconfiado daquele lugar abandonado, então vasculhei os arbustos próximos à caixa e me certifiquei de que só havia nós naquele local.
Voltei até o carro e falei para ela:
- Tem duas coisas estranhas aqui. A estrada está deserta, não vejo nenhum carro passar e essa caixa esquisita. Como ela veio parar aqui? Será que caiu de algum caminhão? Vamos deixar a caixa e ir embora!
- Não! Vamos colocá-la no carro e abrir depois, pode ter alguma coisa importante nela. Eu paro o carro perto dela e você a coloca no porta malas.
Levamos a caixa dialogando o tempo todo sobre o seu provável conteúdo. O que aquela caixa estaria escondendo de nós?
- Vamos parar no próximo posto de combustível, quero saber o que tem nessa caixa.
A estrada era margeada por uma plantação de cana de açúcar sem fim, de repente avistei uma estrada de terra adentrando e sumindo entre os pés de cana, parecia levar para lugar nenhum.
Toda aquela tensão do achado mantinha-nos em silêncio absoluto, num jogo de dúvidas procurando respostas. Entre os pés de cana, à beira da estrada surge uma casa velha com uma placa na fachada com os seguintes dizeres: “Caldo de cana gelado”.
- Estaciona nessa casa, vamos tomar um caldo de cana e abrir a caixa.
No balcão estava um homem de aparência sofrida que nos atendeu com muita atenção, uma pessoa conversadeira e prestativa, então lhe contei a história da caixa e caminhamos até o carro para abri-la. Era uma caixa vermelha com uma estrela na tampa, ao ver a caixa o homem recuou e se negou a tocá-la dizendo:
- Você não deve abrir essa caixa! O melhor a fazer é levá-la até a casa da velha do canavial. Ela deve ter a chave!
Olhei para a amiga e perguntei: - O que você acha? Vamos jogar essa caixa fora e seguir viagem?
- Não! Vamos voltar e conversar com a tal dama do canavial.
- Isso não me está cheirando bem, mas se você quer. Vamos!
Entramos no carro e voltamos, porém desta vez eu que estava no volante, já que a estrada era de terra e desconhecida. Entramos naquele mundo de canavial sumindo naquela estrada estreita. A apreensão me dava ansiedade e eu acelerava fundo querendo chegar rápido. No retrovisor a poeira escondia o canavial, que nos escondia do mundo.
Depois de muito rodar, finalmente chegamos a uma casa muito velha coberta com sapé, estacionei o carro na frente e a amiga falou:
- Vai você!
- Passa para o volante e mantenha o carro ligado. Eu acho que estamos nos metendo em uma fria. Espero que tenha saída!
Saí do carro e bati palmas para chamar a atenção da moradora.
Uma mulher velha abriu a porta e falou:
- Você trouxe a minha caixa de volta!
- Como a senhora sabe que estamos com a caixa?
- Que outro motivo traria vocês até aqui?
- Sim! Estamos com a caixa.
- Vocês estão curiosos para saber o que tem dentro dela? Traga-a para dentro que eu tenho a chave.
- Eu não quero saber o que tem na caixa! Pode ficar com ela que vamos embora.
Foi nesse exato momento que a curiosidade feminina tomou a frente e minha amiga falou:
- Viemos até aqui com essa dúvida, Não quero ir embora sem saber o que há dentro dessa caixa. Entramos na casa, colocamos a caixa sobre a mesa e quando a abrimos, ficamos espantados com tanta coisa inútil para nós, tinha fotos de pessoas desconhecidas, notas de dinheiro sem valor e uns vidros de perfumes guardados cuidadosamente em um canto da dela. Enquanto a mulher falava sobre os objetos contidos na caixa, ela retirou dois frascos de perfumes e ofereceu para que provássemos o aroma diferente. Aí é que estava o segredo da caixa, pois os frascos tinham alguma substância alucinógena que nos fez adormecer profundamente. Acordei horas depois, estirado ao chão com as mãos amarradas, vendo a amiga desacordada e também amarrada. Com muito esforço consegui me soltar e acordá-la. Na fuga percebemos que nosso carro desaparecera, então fugimos entre os pés de cana para não chamar a atenção. No meio do caminho a poeira na estrada de terra denunciava que algum carro seguia em direção à casa da velha canavieira, olhamos atentamente e vimos que era o homem do caldo de cana dirigindo o nosso carro. Eu já imaginava que ali tinha alguma coisa errada, mas não esperamos para conferir.
Seguimos pelo canavial até a estrada, onde conseguimos uma carona que nos trouxe de volta para casa. O homem que nos deu carona falou:
- Imaginem vocês que quando eu seguia viagem, avistei uma caixa no meio da estrada, mas não parei, pois uma caixa abandonada em uma estrada deserta, por mais deserta que seja, só pode ser um golpe, então o melhor a fazer é ignorá-la e seguir nosso destino.
- Verdade! Com certeza era uma caixinha de surpresa.
Voltamos sem o carro e sem a vaquinha malhada, mas eu não consigo deixar de pensar nela. Vou ter que correr o risco de novo para buscá-la sozinho, pois a minha amiga não quer correr o risco de encontrar aquela caixa novamente.
Olhei a foto da vaquinha malhada. Beijei e falei:
- Estou indo lhe buscar minha vaquinha linda, pois você nasceu para ser minha e nada nesse mundo vai conseguir nos manter separados.
Eu dirigia imaginando que a qualquer momento aquela caixa surgiria novamente em meu caminho, mas não surgiu e quando passei pelo local, vi as cinzas de um canavial devorado pelas labaredas de uma grande queimada. No meio das cinzas havia várias carcaças de carro, inclusive a do nosso.
O que será que aconteceu naquele lugar? Eles devem ter deixado alguém muito furioso.
Éh Malhada! Tudo isso aconteceu quando fui te buscar para morar aqui comigo e você ainda faz pouco caso de mim. Fala alguma coisa. Fala!
- MUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUuuuuuuuuuuuu...
- Eu te amo sua doida!
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